sexta-feira, 8 de agosto de 2008

"Sabe como eu consegui essa cicatriz?"

Dessa vez não roubei carro nenhum. Choveu a semana toda e ontem especialmente, choveu além do que eu suportaria para um trajeto de volta sentido Corinthians-Itaquera. Era 16h32. e do 16º andar da altura de um número qualquer da Av. Paulista, não se via o que se diz ser a luz do dia.
Portanto, às 18h30 me enfiei nos caminhos subterrâneos e alheios à chuva. Por esse motivo, inclusive não pude experimentar um novo modelo “emprestado” de um carrão qualquer que circula por ali. Até porque, não tiraria vantagem alguma; na situação calamitosa em que fica São Paulo em dia de tormenta, ter qualquer bilhete único carregado já é um luxo.
Desci na estação Santa Cruz. Como sempre, utilizei de artifícios pouco eficazes para fingir que não estava me sentindo, digamos...só. O shopping estava cheio, quase não dava para andar sem esbarrar em alguém, como então sentir-se só num lugar como aquele? A questão é que nem sempre me sou um companhia agradável ou que preencha alguns quesitos básicos. Não tenho uma outra mão esquerda para segurar a direita, por exemplo.
O grande inconveniente deste shopping, além das lembranças enjoativas que me vinham à memória ( e não vêem ao caso ) é que a cada piso que se chega, se é obrigado a atravessá-lo inteiro no sentido oposto para subir a outra escada rolante que levará ao piso seguinte. Ou seja, em cima do meu salto alto desconfortável, feito barata tonta de um lado para o outro, pouco me importando com as quinquilharias das vitrines do percurso, alcancei o piso da bilheteria. Que é o mesmo da praça de alimentação. Eu estava faminta, mas tinha que comprar o ingresso.
Na fila, após alguns minutos para entender a ordem em que anunciavam os filmes e sessões disponíveis e quase ficando na posição confortável de estar assistindo outro filme por mim e comigo, abro um espaço pequeno para perceber as pessoas ao redor e sou nocauteada. Imagino que das 30 pessoas da fila eu era a trigésima-primeira-e-única-desacompanhada.
Mais uns minutos de reflexão e bem... O fato de estar desacompanhada não quer dizer absolutamente nada, não é mesmo? Milhares de pessoas saem desacompanhadas durante e dia e existem milhares de motivos para tanto. O meu motivo era só mais um deles. O importante era que eu tinha meia hora para comer e aproveitei bem o tempo.
A praça estava lotada e sentei numa mesa ao lado de uma menina que me disse que ninguém sentaria ali. Tratei então de me colocar no papel de ninguém e me acomodar para melhor...apreciar meu nada modesto prato, que deveria caber em trinta minutos.
A menina tinha em seu prato exatamente três bolinhos de queijo, uma coxinha e um copo de coca-cola acompanhando. Tive vontade de oferecer um pouco da minha comida, mas estava envergonhada duplamente de comer tanto e de querer oferecer comida para uma desconhecida que poderia me achar um bocado inconveniente. Desisti da idéia.
Peguei a sessão das 19h30. Duas horas e quarenta minutos. Achei o filme bom, mas até agora não sei o que achei de verdade. De verdade eu...acho que com “de verdade” quero dizer que não sei se o filme...Ah, enfim. O filme cumpriu sua função básica e primordial de me distrair.
Não foi bem uma distração suave, daquelas açucaradas. Tanto que saí da sala do cinema com uma dor de cabeça considerável e não era só os primeiros sintomas de uma possível gripe.
Outra vantagem de não ter roubado o carro era que continuava a chover e o metrô estava vazio. Em uma hora e quinze minutos cheguei em casa. Não roubei nada, não ganhei nada, não perdi nada. Não precisa efetivamente acontecer alguma coisa para se estar cansado de um dia mais do que de sua vida inteira e eu descobri que estava.
Um dia só às vezes pesa muito; não é preciso muita coisa e é pior quando dá meia-noite, outro dia chuvinhento vai começar e o telefone não tocou nenhuma vez durante as incontáveis vezes que se pode olhar ao relógio para tentar marcar com exatidão o momento que as coisas acontecem. E elas não acontecem. Acontecem. Não.

Um comentário:

UtópicA disse...

Ah, eu gostei do batman. Alias, pra falar a verdade, o q eu mais gostei nesse batman foi o curinga. Gostei tanto dele, que eu nao consigo sentir raiva dele, eu sinto peninha. Chego a acreditar em todas as diferentes versoes da historia das cicatrizes - mesmo sabendo que a origem delas foi o acido, etc. Me comoveu ver a loucura transcendendo a propria razao da vida. A insanidade sublimando o medo da morte e da dor. Acho que viajei, ok. Mas gostei.