Entrou no vagão. Eu estava lendo, mas levantei a cabeça para ver se alguém iria ceder o lugar nos acentos de cor cinza ocupados por quem não precisava tanto deles. A filha segurava pelo braço. "Senta aí mãe". Ela sentou com cuidado e com os olhos característicos de quem nunca viu ou há muito que não vê, endireitou o corpo para a descida até o banco. Segurava a bengala só com as pontas dos dedos. Negros.
A filha que já tinha se desocupado de ajudar à mãe, fixou o olhar na janela. Ou a direção da cabeça pelo menos, porque os óculos que meteu em cima do nariz não permitiam tomar muita certeza de para onde olhava.
A criança no colo da mãe, do outro lado, na outra poltrona dava as risadas típicas da empolgação de estar num lugar feito o metrô. Empolgação só para a idadezinha dela. Depois passa. Cada risada que a criança dava, os lábios da negra empurravam de leve as bochechas. E as lágrimas começaram a brotar. O túnel chegou e os olhos se fecharam para conter o que não tem cor. E como produz dor um corpo que não vê? O túnel acabou. Demorou, mas voltou a abrir. Rosto sério, congelado. A criança ri de novo, mas o lábio fica imóvel. "Já chegou filha?". A filha se veste com roupas de quem não tem como se vestir do jeito que queria. "Não...tá chegando". E a mãe se veste do jeito de quem não pode dar à ela o que queria dar. Chega a Sé, meu livro abandonado na mão; ela se deixa levar pelos braços da filha, pela multidão ecom os exames ao lado da bengala.
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