Era noite de jazz. Matilde iria à um desses lugares de gente sóbria e atenta à música. Nada de flertes fatais, guitarras imaginárias nem conversa fiada sobre videos virais malditos. Homens de olhar distraído e camisa xadrez. Mulheres fingidamente desencanadas e roupas escuras.
Mesmo conhecendo o figurino, Matilde colocou seu estampado de flores.
Entrou no tal lugar e se deu, logo de cara, ao direito de se apaixonar por um barbudo. Um dos oitocentos e cinquenta e dois barbudos do recinto. A barba também era acessório obrigatório masculino ali. Matilde, piegas e breguinha que só ela, foi se arrepiando e se ardendo toda só de pensar na possível aproximação com o moço. Mas na realidade que se dava ali, era o amigo do Barba que olhava insistente para Matilde.
Faz de conta que o Barba tava com pressa e foi pagar a comanda. Aí a Matilde tomou coragem e foi na direção dele.
- Desculpa moça...é que eu tava te olhando de longe e...
Era o amigo do Barba parando Matilde. Bonitinho também e por isso Matilde até começou a cogitar a possibilidade de trocar de barba. Afinal ele foi até ela...
- Moça?
- Oi?
- Não ouviu o que falei?
Matilde sofria de DDA.
- Desculpa, não entendi.
- Seu vestido está rasgado
Ein?
Matilde correu pro banheiro, ligou pra sua amiga ir socorrê-la com agulha e linha.
- Mas é claro que não trouxe meu estojo. Cada uma ein Matilde? Toma, consegui fita crepe. Dobra um teco do vestido pra dentro e prende com a fita.
Com sua pouca habilidade manual, feminina e vital, Matilde foi arrumando a barra do vestido com a atenção de quem está tentando arrumar aquelas outras coisas que a fita crepe não cola.
- Matilde...
- Quê?
- O vestido...
- Tô arrumando, perae.
- Tá mega transparente atrás.
Matilde era adepta de calcinhões com estampas coloridinhas. A de pequenos corações era a de noite. E era isso que tava mega exposto nos seus fundos.
- Cara...porra Matilde! Por que você não colocou alguma coisa por baixo?
Matilde em sua pouca habilidade feminina, vital e mental não soube responder. Saiu correndo, pagou a conta, largou a delatora detalhista e pegou o carro dela. Avistou o carro do Barba na esquina. Ultrapassou, brecou e fechou a rua!
O sonho de Matilde descosturada era ser atriz de filme de ação. Desceu do carro e entregou seu telefone anotado no papel pro Barba, que dirigia com uma lata de cerveja na mão.
- Adorei sua Barba,
Tanta coisa pra dizer ein Matilde?
O Barba olhou o papel.
- Seu sobrenome é igual ao meu!
T-a-n-t-a coisa pra dizer ein Barba?
A barba do cara já tava imensa de tanto crescer, quando se passaram eternos quatro minutos até Matilde dizer que tinha que ir embora porque sim.. E o Barba, com um risinho de canto de boca, aproveitou o vento a favor para dar um passo em direção de Matilde. Ela, ansiosa por facilitar as coisas...tropeçou em si mesma, caiu em cima do Barba e a cerveja dele em cima dela. As flores do vestido foram murchando enquanto o Barba tentava ajudar nossa pseudo heroína a se levantar.
Se ele soubesse que eram anos e toneladas de sufoco...
Acharam melhor se despedir ali mesmo.
Ridícula Matilde, foi encontrada por sua quase ex amiga enquanto olhava o Barba sumir com seu carro no fim da rua. A amiga teve que ajudar com o freio de mão emperrado.
Com sua pouca habilidade vital, mental e sensual, Matilde ignorava o que a amiga dizia e também a quantidade de caras como aquele que já passaram pela sua vida.
Desatenta ao repertório musical da noite, sintonizou o rádio e deixou tocar a música mais batida do Bon Jovi pra ajudar a fugir de quem fugia dela.
Um comentário:
ajudar a fugir de quem fugia dela. ajudar a fugir de quem fugia dela. ajudar a fugir de quem fugia dela. Martelando.
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