domingo, 29 de março de 2009

Não vou me adaptar ou domingo, 29 de março

"Por que pretender, então, que ator está em cena por delegação, por eleição? Quanto ao coro, pode ser, porque ele se origina diretamente do povo. Mas o ator? que é um estrangeiro de passagem..."

Uma vez escrevi, no relatório do leitura do livro do Guénoun, da citação aí de cima (A exibição das palavras - Uma idéia (política) do teatro), que tinha a leve impressão de que me interessei por teatro porque adorei minha primeira experiência como público. Foi no Teatro Popular do Sesi, em 1994, "Píramo e Tisbe". Dez anos de idade.
Hoje, posso dizer que minhas últimas experiências como público, se não fizesse teatro, me fariam passar bem longe de qualquer apresentação... Não é como antes, (horrível dizer isso, já que não sou e não me sinto tão velha) que quando via uma peça ruim, tinha vontade de fazer algo bom como resposta. Esse monte de tranqueiras me fazem querer desistir. Mas, como não irei me permitir desistir duas vezes seguidas, assim num intervalo tão pequeno, da mesma coisa, encontro-me aqui escrevendo sobre o dilema de encontrar um caminho.
É um assunto que venho insistindo há muito , com muita chatice, confesso, mas falei pouco ou quase nada por aqui, por puro e simples desinteresse em expor o assunto. Restou aos amigos me emprestarem ouvidos e ombros para lamuriar. Com ou sem critério.
O teatro que tem sido feito, é uma merda. Sempre se discute isso, não sou a primeira e nem é a minha intenção falar do tema como se fosse super novo. Mas quero dizer aqui que é uma merda, porque não sou uma entusiasta que só porque faz teatro, fala que é tudo incrível, divino, mágico e patetices diversas. Parece que quem diz isso, fica na frente do espelho repetindo o texto do coro dos contentes, até se convencer e ir pra Rossevelt aparecer. Quem fala mais abobrinhas sobre a peça tal? Quem fica mais bonito e parece mais inteligente enchendo a boca para falar sobre o m-É-t-o-D-o. ?
É claro que não tem nada mais fascinante do que fazer um laboratório, ler um texto do Peter Brook (que é o único que ME entende), escavar textos, ir tão fundo numa pesquisa que se chega a "tocar " a essência de qualquer coisa desconhecida e sem nome até então. Se eu fosse ficar só nisso, me juntaria aos botequeiros do Sátyros, sem dúvida; é realmente incrível, indescritível, enobrecedor e é o que move o trabalho, me faz crescer como atriz, gente, como filha, como amiga...Mas não faço teatro só para mim e meus colegas tão bons de pesquisa também. Por outro lado, tão pouco, irei me juntar ao outro coro: os MUITÍSSIMO descontentes, ofendidíssimos pela falta de política do país para com as artes, a alienação do público que NÃO- VAI-AO-TEATRO-PORQUE-PREFERE-ASSISTIR-TV. Não vou mesmo me juntar à eles. Prefiro a TV à me deslocar para o Centro, para casa do c******, para ver um bando de intelectualóide se divertindo às minhas custas.
Assisti à um debate depois de apresentação de uma peça, na semana passada e o discurso pronto do diretor era esse: a falta de recursos e blá blá blá.. Os atores, atrás, fazendo volume, esfumaçavam o teatro com seus cigarros em punho e cara de nem aí para a denúncia política do texto, porque eles estavam ali mesmo era por causa do emprego e ponto. Não tem nada de errado com isso, pelo contrário. Mas eu gostaria muito que isso fosse assumido e discutido como realmente é e não como algo distante, de lá de fora, problema exclusivo dos moradores que ficam embaixo do Minhocão e sim como realidade de quem faz teatro também e inclusive, porque não existe o tal mercado de trabalho. Ao invés disso, colocam o presidente como gerador do problema e o povo como resultado.
Se público não vai ao teatro, meu camarada, não é culpa exclusiva do presidente. Na minha mais que modesta opinião, quem tava lá segurando o microfone e os fazedores de fumaça, vulgo atores, são os responsáveis por trazer ou por expulsar o trabalhador, a professora, o mendigo e a atriz da platéia.
Vou criar um coro novo então, ao invés de desistir em Maio como é de se esperar. Não prometo fazer bonito e nem a revolução. Meu coro vai ser pequeno e contaminado de coisas boas. Não, não vamos copiar o Brecht, mas ele vai ser algo bom que estará na contaminação. Não teremos cara de artista, nem de crítico, não usaremos cachecol num calor infernal de quarenta graus não falaremos bem da peça do Antunes, só porque ele é o Antunes e tem a sua grande importância. Se ele fizer coisas ruins, seremos camaradas e falaremos disso abertamente. Também conversaremos com o trabalhador nosso de cada dia sobre teatro, sobre cozinha, sobre a política externa e futebol, claro. Jogaremos video game. Falarenos sobre religião e excomunhão também. Estaremos no busão, não sem propósito e nem para sugar o que acontece ali como material.
Seremos nosso próprio material e ficaremos no boteco da esquina falando sobre o gostosão ou a gostosona que atravessou a rua. Seremos os tais estrangeiros, vendo e fazendo não como se fosse, mas sendo a primeira vez. Se colocando no lugar de quem vai ver e ouvir, antes de fazer qualquer bobagem para satisfazer um capricho. Faremos COM capricho PARA o OUTRO, que tá logo ali na frente. Para a criança de dez anos, com o pai na fila do pão. Amém?

3 comentários:

Anônimo disse...

Bom. Muito bom.
Se você não ganhar dinheiro com isso um dia, o mundo é injusto mesmo.

Naty Dezoti disse...

Joguei no google!!!
"Irritada!"

Não creio que é sua!
Tô sépia!
Ahahaha

Anônimo disse...

vc está integrada! contra os rótulos, massas...mais próxuma de sua verdade! faz teeeeempo que não vou ao teatro, espero que possamos ser público de algum bom espetáculo ou simplesmente de nós mesmos.

Flávio