...ou "a carta dentro do livro que dei embora"
Foi por causa daquele dia que entrei atrasada na sala de aula. Aquele dia decidiu todo o resto. Fiquei vermelha e sem jeito, porque desde aquele dia, você veio para cima de mim com uma obstinação que me constrangia diante de mim mesma. E o que eu estava vivendo naquele momento era o contrário.
Repetia um discurso de desapego como uma compradora compulsiva que adquire sapatos sem critério. Consumia a ideia de que estava completamente errada por querer alguém. Então...não te queria. Te deixava ali no meu armário de sapatos.
Era um sapato bonito demais, também por isso te escondia. Era o que eu achava. Também me achava menor perto de você. Ficava insegura, com medo de fazer bobagem, de não conseguir te acompanhar. Mas você me superava em insegurança. Então, usava o fato de perceber isso e te afastava com o discurso de mulher sufocada, que me convinha muito bem. Fazia você pensar que estava apertando o meu pé, quando na verdade, meu medo era de desequilibrar. Não tinha coragem de desfilar com você e chamar atenção com algo que queria caber nos meus pés.
Ainda não tinha tirado o velho sapato que insistia em querer se arejar em cima do muro.
Te escondia, porque você era bonito e tinha outras como eu e até mais que eu...Sabia que você vestia os pés delas mesmo dizendo que só queria os meus. Te odiava por isso, mas fingia que não ligava porque era bom quando te usava dentro do apartamento frio ou de um restaurante/teatro/esquina escura. Te escondia, porque seu telefone tocava enquanto estava comigo e você não atendia.
Ai precisei desses anos para saber que te escondia por causa desses motivos bobos e porque não tinha meios de mostrar que gostava de você. Ao contrário da compradora compulsiva, eu não tinha muitos sapatos. Mas era mais fácil esconder o sapato que mais me caia bem do que andar com ele por aí. Sempre fui de pedir desculpas por existir para não incomodar ninguém e em relação a você não foi diferente.
E agora que os meus pés não devem mais te encontrar, não me procure para caminhar por lugares escuros. Você me disse outro dia que os caminhos por onde você tem percorrido te satisfazem. Então, não me convide para te afundar na lama.
Estou procurando fazer o que me sugeriu.
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